sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Você sabe o que é Juízo Temerário?



Chama-se de juízo temerário o julgamento apressado, arrogante, baseado em impressões, em informações de segunda mão, em maledicência e no “ouvi dizer”. Para o julgamento não ser temerário, a sua motivação precisa ser trazida à tona e examinada. Por trás do juízo podem estar a inveja, o ciúme, a competição e o desejo de vingança. Em outras palavras, o auto-julgamento deve preceder o julgamento alheio. O mandamento de Jesus no sermão do Monte é claro: “Não julguem os outros para vocês não serem julgados por Deus” (Mt 7.1, NTLH).

 

Se as Escrituras desencorajam o juízo temerário, elas encorajam o discernimento espiritual, sem o qual corre-se o risco de chamar o mal de bem e o bem de mal, a escuridão de claridade e a claridade de escuridão, o amargo de doce e vice-versa (Is 5.20).

Discernimento espiritual nada mais é do que distinguir com a maior precisão possível uma coisa da outra — cujas diferenças nem sempre aparecem à primeira vista — com o propósito de fazer o juízo certo. Em qualquer esfera da vida, há uma porção de pessoas, de pronunciamentos e de produtos falsos. Lidamos com isso diuturnamente. O mesmo problema invade e permeia a vida religiosa. É impressionante a lista de coisas falsas que a Bíblia denuncia: testemunho falso (Êx 20.16), notícias falsas (Êx 23.1), acusação falsa (Êx 23.7), juramento falso (Lv 6.3), língua falsa (Pv 21.6), pena falsa (Jr 8. 8 ) , visão falsa (Jr 14.14), circuncisão falsa (Fp 3.2), humildade falsa (Cl 2.23), irmãos falsos (2Co 11.26), profetas falsos (Mt 7.15), mestres falsos (2Pe 2.1), apóstolos falsos (2Co 11.13), espíritos falsos (1Jo 4.1) e até cristos falsos (Mt 24.24).

O campo do discernimento é muito vasto e difícil. É preciso discernir entre o bem e o mal, entre a verdade e a mentira, entre a vontade de Deus e a vontade própria, entre os grandes momentos de Deus e os acontecimentos comuns, entre o Espírito da verdade e o espírito do erro. Uma das parábolas de Jesus fala sobre o trigo e o joio. Buscamos obedecer ao conselho do apóstolo: “Não tratem com desprezo as profecias, mas ponham à prova todas as coisas e fiquem com o que é bom” (1Tm 5.20-21).

Texto do padre Reinaldo Bento /Facebook


sábado, 10 de setembro de 2022

05 criminosos convertidos e salvos

05 criminosos convertidos e salvos

“Todo santo é um homem antes de ser santo. E um santo é feito a partir de todo tipo de homem” G. K. Chesterton

Assim como o ouro é matéria-prima para as jóias, a humanidade é matéria-prima para se fazer santos. E, segundo Chesterton, Deus pode fazer um santo a partir de qualquer tipo de homem.

Cristo veio fazer dos pecadores filhos de Deus. A Igreja Católica, guiada pelo Espírito Santo, ensina que a misericórdia deve andar junto com a justiça, e que nenhum crime passará impune, mas lembra que pecado nenhum é maior do que a misericórdia de Deus e que no maior dos assassinos ainda há um fio do Criador.

Muitos homens maus encontraram a luz no fim do túnel, arrependeram-se e abraçaram a morte com ternura. A justiça de Deus transcende nosso entendimento e Seu perdão é infinito, basta uma contrição sincera e um desejo de estar com Ele no Céu. Há santos e beatos que em vida cometeram ações terríveis, como assassinato. Eles são a prova de que Deus permite um mal para que seja feito um bem maior.

O apóstolo São Paulo, que foi um desses homens, explica na carta aos Romanos que não há um justo sobre a terra, mas que é Cristo que justifica aquele que apela à fé. E “tendo sido justificado, pela fé, estamos em paz com Deus por meio de Nosso Senhor Jesus”. Outro grande exemplo foi São Dimas, o ladrão que estava crucificado ao lado de Jesus e que se arrependeu e foi perdoado por Jesus.

Apresentamos a você alguns desses homens ímpios que foram presos por seus crimes, apelaram à fé e foram salvos. Assassinos e viciados, encontraram em Cristo uma saída para as trevas interiores:

São Mark Ji Tianxiang



“Feliz o homem que sofre tentação, pois após ter sido provado receberá a coroa da vida" (Tiago I,12). A Coroa dos Mártires foi desejada por muitos santos, pois o martírio purifica os pecados. São Mark Ji Tianxiang foi um dos coroados.

Nascido no século XIX, Mark foi líder cristão chinês e médico que atendia os pobres de graça. Depois de ter um problema estomacal, teve que se tratar com uma droga chamada ópio, mas acabou se viciando - algo vergonhoso na região.

Sempre que usava, ele procurava o perdão. Confessou-se tantas vezes que o padre confessor julgou que ele não estava levando a penitência a sério e negou a absolvição - a confissão é inválida quando não há propósito de não pecar. Não era o caso. Mark estava, de fato, doente.

A atitude do padre afastaria muitos da fé. Mas, longe dos sacramentos, Mark pensou em algo que pudesse lhe fazer chegar a Cristo. Lembrou-se da coroa dos Mártires, única forma de salvação restante.

Ele orou para se tornar mártir e sua chance chegou em 1900, quando os Rebeldes Boxer começaram a se voltar contra os cristãos. Nessa, Mark foi preso com seu filho, netos e noras. Os cristãos presos se enojaram com a presença do viciado. Ainda assim, determinado a encontrar o Mestre, ele não negou ao Senhor.

A Medicina da época não tinha recursos para lhe ajudar, por isso ele morreu sem se livrar do vício. Mesmo assim alcançou a graça extraordinária da perseverança. Ji seria executado com sua família. Ao ser questionado pelo neto aonde iriam, ele respondeu: “para casa”.

Ele implorou que o matassem por último e ficou ao lado dos familiares decapitados para que não morressem sozinhos. Chegando sua vez, cantou as Ladainhas da Santíssima Virgem e morreu serenamente. Sem comungar por 30 anos, não se esqueceu da carta de São Tiago. Abraçou o martírio e foi abraçado por Cristo.

Mark Claude Newman



“Derrubou do trono os poderosos e exaltou os humildes”. Nossa Senhora provou que ama os mais simples. Diversas vezes fez visitas à pessoas ignorantes na fé, como Claude Newman, nos Estados Unidos.

Diferente do chinês Mark Ji, Newman pouco sabia sobre a fé. Nasceu em 1923, em Arkansas, e viveu na casa da sua avó. Negro, num país com ideologias racistas, ainda a criança, trabalhou nos campos de algodão.

Ele foi preso e condenado à morte aos 19 anos, depois de matar o marido de sua avó, Sid Cook. Newman descobriu que ela foi espancada pelo marido e se vingou.

Na prisão, ele conversava com alguns prisioneiros. Um deles, que era católico, usava um pingente no pescoço. Newman quis saber o significado, mas o prisioneiro, não soube responder. Vendo que o pingente chamou a atenção, o prisioneiro disse: “tome isso”.

Era a Medalha Milagrosa, devoção famosa que se originou na França. Newman não sabia disso, mas adorou o presente. Naquela noite a Virgem lhe visitou, acordou-o e disse: “Se quer ser meu filho, chame um padre da Igreja Católica”. E desapareceu. Era a mulher mais linda que ele já viu.

O padre Robert O'Leary foi chamado. Ele começou a ensinar o catecismo ao rapaz, que contagiou outros na cela. Quando o padre foi ensinar sobre os sacramentos, Newman relatou que Nossa Senhora lhe ensinou sobre Confissão e Eucaristia, e falou o que ela havia dito. O padre, de princípio, estava cético quanto à visita da Virgem, mas depois disso, acreditou no prisioneiro.

Newman mudou o clima hostil na prisão. Havia um rapaz que não ia muito com sua cara. Seu nome? James Hughes. De resto, todos gostavam dele e chegaram a pedir que sua condenação fosse adiada por duas semanas.

Isso entristeceu Newman. Seu desejo de alcançar o Céu o fez desejou a morte. “Se tivesse visto o rosto de Dela, e olhado em Seus olhos, não gostaria de permanecer neste mundo outro dia”. Disse Newman ao padre, que lhe orientou a oferecer cada minuto separado de Maria em oferta à conversão de Hughes. Ele fez isso e morreu feliz.

Hughes continuou mal até o dia de sua morte. Todos esperavam sua conversão. Quando estava para morrer, ele blasfemou grosseiramente, mas, no último segundo, pediu para chamar o padre. Hughes confessou seu abandono da fé, seus pecados horrorosos. Ao padre, ele relatou que Claude Newman lhe apareceu e disse: "Ofereci minha morte em união com Cristo na cruz para sua salvação”. Isso fez Hughes se arrepender.

Talvez por isso a passagem de Mateus fala para que seja feita visita aos presidiários, Deus quer usá-los para conversão dos maus, e por isso pedimos intercessão de Claude Newman, que honrou seu nome e fez de Hughes um novo homem.

Alessandro Serenelli



“Quero vê-lo perto de mim no céu”, foi o que disse Santa Maria Goretti antes de morrer e se referia a Alessandro Serenelli, um camponês italiano que nasceu em 1882.

Ele perdeu a mãe ainda quando recém-nascido e o pai alcoólatra era ausente demais para preencher o vazio de sua alma. Na sua família, a mais pobre da região, muitos tinham distúrbios mentais e ele cresceu pertubado.

Aos 20 anos, sem conseguir equilibrar os pensamentos, ele começou a nutrir um desejo sexual por Marieta Goretti, de 11 anos. Ela negou duas vezes, então ele decidiu estuprá-la. Maria Goretti resistiu dizendo que isso ofende a Deus, mas o rapaz, frustrado, feriu a jovem 11 vezes com uma faca. Ele foi preso e ela, no hospital, antes de morrer, disse que o perdoava e queria vê-lo no céu.

Demorou muito para Alessandro demonstrar arrependimento, e nas prisões que frequentou se podia ver quão cínico e frio ele era. Um padre tentou ao máximo amolecer o coração daquele pecador, já que era o desejo da santa. Certa vez, o sacerdote deu a Alessandro alguns livros católicos para se distrair. Ele deu uma olhada e notou um livrinho pequeno de Maria Goretti, que já era conhecida nas províncias. Ao ler a maneira brusca como aconteceu, lembrou-se da cena com vergonha, notou o monstro que era e chorou pela primeira vez.

Culpado pelo que fez, ele chegou a ser confortado em sonho por Maria Goretti. Anos depois, ele foi visitado pela mãe da Santa que disse que lhe perdoava. Foi uma cena linda, ambos comungaram e se ajoelharam juntos. Os dois estiveram na canonização de Goretti em 1950. O assassino arrependido pôde presenciar o Papa Pio XII perguntar aos jovens presentes: "Jovens, prazer aos olhos de Jesus, estão determinados a resistir a todos os ataques à castidade com a ajuda da graça de Deus?". A resposta foi um grande "sim".

Henri Pranzini



Em 17 de março de 1887, um assassinato brutal tomou conta dos jornais franceses e afetou a população de Paris. Henri Pranzini, um aventureiro e poliglota tradutor da França, entrou para assaltar um cofre num apartamento, mas não conseguiu. Frustrado, roubou as joias de quatro vítimas e fugiu. A cena presenciada pela polícia era de três mulheres com as gargantas decapitadas e uma garota com os dedos da mão direita cortados, junto a uma poça de sangue coagulado no tapete da sala e a marca do pé do assassino.

Henri Pranzini foi encontrado, preso e odiado por toda população. Os jornais faziam circular a notícia de que Pranzini foi condenado a pena de morte. Uma menina muito dócil chegou a ler a matéria em um desses periódicos e sentiu que devia rezar pela alma dele. Seu nome? Teresa de Lisieux, a Santa Teresinha do Menino Jesus. Ela meditou no Manuscrito A de sua História de Uma Alma, que, vendo o sofrimento de Jesus na Cruz, gostaria de dar de beber àquele que disse: “tenho sede”. Cristo estava sedento de almas e Teresinha queria ajudá-Lo: “Queria dar de beber a meu Bem Amado e sentia-me devorada pela sede das almas”. Ela disse que ardia pelo desejo de arrancar as almas dos grandes pecadores das chamas eternas.

Teresinha quis a todo custo impedir Pranzini de cair no inferno que usou todos os meios imagináveis. Mas, sentindo que por ela mesma nada poderia, ofereceu a Deus os méritos infinitos de Nosso Senhor e os tesouros da Santa Igreja; mandou, por meio de sua irmã Celina, celebrar uma missa, pois não queria ser obrigada a dizer que era para o grande criminoso. Teresa, depois que Celina insistiu, explicou a intenção, e ficou feliz por sua irmã ter apoiado a “converter meu pecador”.

A Santa recebeu a notícia, por meio do Jornal “La Croix”, de que Henri Pranzini, antes de ser guilhotinado, arrependeu-se e disse, pegou um crucifixo e o beijou três vezes.

Jacques Fesch



“Em cinco horas verei a Jesus”. Frase escrita por Jacques Fesch em seu diário antes de morrer, ele foi um assassino convertido pela intercessão de Teresinha de Lisieux, que, já no céu, ainda estava sedenta de tirar almas pecadoras do inferno e dá-las a Jesus.

Nascido na França, em 1930, foi criado num lar católico mas de pouco fervor, abandonou a fé aos 17 anos. Os alunos com quem estudou diziam que ele não era interessado e faltava demais. Aos 21, engravidou uma jovem chamada Pierrette, mas, tempos depois, largou o emprego no banco de seu pai, abandonou a esposa e a filha e alimentou uma vida imoral, tendo tido um filho com outra mulher. Jacques quis fugir em um Veleiro pelo Oceano Pacífico, mas como seus pais se recusaram a pagar a viagem, em 1954, tentou roubar um comerciante de moedas de ouro, sem êxito. Para escapar, atirou no policial que o perseguia e o matou. A Corte Francesa o condenou à morte em 1957.

Na prisão, de início, Jacques se mostrava indiferente, mas, por intermédio de seu advogado católico, de quem ele zombava nas primeiras visitas, começou a criar uma vida intelectual, impressionando a si mesmo, que era desinteressado na escola. Começou a ler e a escrever e sua jornada intelectual o levou a uma jornada espiritual. Teve contato com muitos santos e se deparou com a História de um Alma, de Santa Teresinha. Ela o ajudou muito em sua conversão, pois o assassino, assim como Henri Pranzini, começou a amolecer o coração. Disse: “Acabei de ler o livro de Santa Teresinha. Que linda Santinha. E como está tão próxima de nós. É necessário ser como as criancinhas e fazer o que elas fazem”.

Santa Teresinha chamou um criminoso de “meu pecador”. Jacques, que voltou a ser uma criança e começou a se apaixonar fortemente por Jesus, chamava a santa de “minha Teresinha”. Ele se arrependeu amargamente de seu crime e aceitou seu castigo serenamente. Teve tempo de se unir em Matrimônio Religioso com sua esposa um dia antes de sua execução. A última anotação em seu diário diz “em cinco horas, verei Jesus”. Morreu na guilhotina em primeiro de outubro de 1957, dia de Santa Teresinha, e existe um movimento internacional que pede a abertura do processo de beatificação.

Quer ler a vida de Jacques Fesch? - Confira: https://www.amazon.com.br/Em-Cinco-Horas-Verei-Jesus/dp/8553019187 

Conclusão

Os méritos desses criminosos não estão no crime, mas no arrependimento, pois eles mostram que a salvação é possível. Cristo está na cruz até o fim dos tempos e ele está esperando o último pecador se arrepender para sair de lá. Tiremos o Cristo da cruz, anunciemos aos oprimidos a Salvação, proclamemos ao mundo que ele tem um Salvador.

sábado, 3 de setembro de 2022

Uma confissão com o Padre Pio





Uma confissão com o Padre Pio

Depoimento da conversão de Frederick Abresh

Em Novembro de 1928, quando fui ver o Padre Pio pela primeira vez, poucos anos tinham passado desde que eu me convertera do protestantismo para o catolicismo, algo que apenas tinha feito por mera conveniência social. Eu não tinha fé; pelo menos agora entendo que apenas tinha a ilusão de tê-la. Tendo sido criado numa família muito anti-católica e imbuído de preconceitos contra os dogmas - até o ponto de que uma ligeira instrução não era suficiente para apagá-los - eu estava sempre ansioso por coisas secretas e misteriosas.

Encontrei um amigo que me introduziu nos mistérios do espiritismo. Muito rapidamente, no entanto, cansei-me dessas mensagens pouco conclusivas que vinham do além-túmulo; entrei pesadamente no campo do ocultismo e das magias de todos os tipos. Foi então que eu conheci um homem que me disse, em ares de mistério, que ele detinha a verdade única: a 'teosofia'. Rapidamente tornei-me seu discípulo, e nas nossas mesas, fomos acumulando livros com os títulos mais atraentes e tentadores. Com muita presunção, ele utilizava palavras como reencarnação, logos, Brahma, Maja, esperando ansiosamente alguma nova e grande realidade que supostamente deveria acontecer.
Não sei porquê - ainda acho que era para agradar à minha esposa - mas de vez em quando ainda me acercava dos santos sacramentos. Este era o estado da minha alma, quando, pela primeira vez, ouvi falar do padre capuchinho que descreviam como um crucifixo vivo, fazendo milagres contínuos. Cheio de curiosidade, decidi ir vê-lo com os meus próprios olhos. Ajoelhei-me no confessionário e disse ao Padre Pio que considerava a confissão uma boa instituição social e educacional, mas que não acreditava de modo algum na divindade do sacramento. O padre, com expressão de viva dor, respondeu-me: 'Heresia! Então, todas as suas comunhões foram sacrílegas...tem de fazer uma confissão geral. Examinar a sua consciência e lembrar quando foi a última vez que fez uma boa confissão. Jesus tem sido mais misericordioso consigo do que com Judas'.

Olhando, então, por cima da minha cabeça, com um olhar severo, disse em alta voz: 'Louvados sejam Jesus e Maria!' E dirigiu-se à igreja para ouvir as confissões de algumas mulheres, enquanto eu fiquei na sacristia, profundamente comovido e impressionado. A minha cabeça girava e eu não me conseguia concentrar, pois martelavam-me nos ouvidos as suas palavras: 'Lembre-se de quando foi a última vez que fez uma boa confissão!' Com dificuldade, consegui chegar à seguinte decisão: vou dizer ao Padre Pio que eu era protestante e que, depois da abjuração, fui rebatizado condicionalmente e que todos os meus pecados de minha vida passada haviam sido apagados pelo santo baptismo mas, para a minha inteira tranquilidade, eu gostaria de começar a confissão desde a minha infância.

Quando o padre retornou ao confessionário, repetiu-me a mesma pergunta: 'Então, quando foi a última vez que fez uma boa confissão?' '. Eu respondi: 'Padre, eu ... e ele então interrompeu-me, dizendo: 'a última vez que fez uma boa confissão foi quando regressou da sua lua de mel, vamos deixar tudo o mais de lado e começar a partir daí'. Fiquei sem palavras, tomado de estupor, e percebi que havia tocado o sobrenatural.

O padre, entretanto, não me deu tempo para refletir. Revelando o seu conhecimento do meu passado, na forma de um questionário, enumerou todas as minhas culpas com absoluta precisão e clareza. Depois me fez conhecer todos os meus pecados mortais com palavras impressionantes, que me levaram a compreender a gravidade dos meus pecados, acrescentando com um tom de voz inesquecível: 'cantava um hino a Satanás, enquanto Jesus, de braços abertos, ardia de amor à sua espera'. Então deu-me a penitência e absolveu-me.

Fonte: Facebook Padre Reinaldo Bento

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

O HOMEM-MASSA - Dom Fulton Sheen

O HOMEM-MASSA

Por Fulton J. Sheen — Jornal do Dia (RS). Domingo, 27–7–1952.

Um novo tipo de homem prolifera no mundo moderno e, se algum leitor se reconhecer neste artigo, que faça uma pausa, reflita e procure transformar-se. O novo homem é o homem-massa. Ele não dá mais valor à sua personalidade individual mas deseja ser submergido na coletividade ou na multidão.

Este homem-massa pode ser reconhecido pelas seguintes características:

1. Não é original ao julgar ou discernir. Ele nada lê a não ser o jornal diário, a revista ilustrada ou uma novela ocasional. Sobre um assunto, ele pode ter um ponto de vista diferente a externar mas não possui um novo principio de solução.

2. Ele odeia a tranquilidade, a meditação, o silêncio ou qualquer coisa que lhe dê possibilidade de penetrar nos recônditos da alma. Ele tem necessidade de ruídos, ajuntamentos, de ter o rádio ligado, mesmo que não esteja prestando atenção.

3. Precisa de evasão. Necessita fugir de si mesmo. Álcool, coquetéis, histórias policiais, filmes, são tomados em doses excessivas, para matar o tempo. Assim como o gênio ama a concentração, ele procura a dispersão, especialmente no terreno sexual, de maneira a que a excitação do momento o faça esquecer o problema da vida.

4. Ele procura ser influenciado ao invés de influenciar. É muito sensitivo a propaganda, às excitações da publicidade e geralmente, tem no seu jornal diário, um colunista favorito que pensa por ele.

5. Acredita que todo instinto deve ser satisfeito, não importando se se exerce de acordo com a lógica ou a moral. Ele não compreende continência ou autodisciplina.

6. Nas suas crenças sobre o que é certo e o que é errado, ele varia como um cata-vento. Ele mantém posições que nada mais são do que uma sucessão de contradições segue, num mês, certas vias de pensamento e, no mês seguinte, as abandona. Ele não vai a parte alguma mas está certo de que está no bom caminho.

Não possui o menor sento de gratidão para com o passado nem de responsabilidade para com o futuro. Nada interessa a não serem distrações. A vida, então, se torna a louca soma de instantes sucessivos que não fazem sentido entre si.

7. Ele identifica dinheiro e prazer e procura ter muito do primeiro para conseguir bastante do segundo. Mas o dinheiro tem que ser conseguido com o mínimo esforço possível. Seu ego é o centro de tudo e tudo com ele se relacionam, com o dinheiro a servir de intermediário.

8. Para evitar a solidão, ele recorre a estar com pessoas em night-clubs, festas e diversões coletivas. Mas, de cada um delas, ele retorna mais solitário do que antes, chegando finalmente a estar de acordo com Sartre, quando ele diz que o “inferno são os outros”.

9. Sendo um homem-massa completamente estandardizado, ele odeia a superioridade nos outros, seja real ou imaginária. Adora escândalos porque eles parecem provar que os outros não são melhores do que ele. Despreza a religião pela única razão de achar que, ao negá-la, garante para si a possibilidade de continuar a viver como vive, sem ter remorsos na consciência.

10. Ele pode ser designado mais por um número de que por um nome, de tal maneira

está imbuido das ideias coletivas. Até a autoridade que invoca é anônima. Sempre informa que “estão dizendo” isto ou “estão fazendo” aquilo. O anonimato torna-se uma proteção contra a obrigação de assumir responsabilidades. Nas grandes cidades, ele se sente mais livre porque é menos conhecido. Ao mesmo tempo, porém, ele odeia isso porque elimina as suas possibilidades de se destacar, de possuir uma distinção pessoal.

Estas são as dez características do homem-massa, que é a matéria prima de toda a forma de totalitarismo, do fascismo ao comunismo. Psicologicamente, ele é também um homem infeliz, cheio de desespero, ansiedade, medo e atemorizado com a falta de sentido da vida. Mas, ele não perderá a esperança, se conseguir se conhecer. A única razão que ele tem para se perder na multidão, é a impossibilidade de esquecer sua miséria interior. É necessário, portanto, que ele se aparte das massas e comece a sondar o próprio eu. A fuga é uma covardia, um escapismo. Especialmente a fuga pelo anonimato.

É preciso coragem para olhar no espelho da própria alma e ver as rugas causadas pelo mau procedimento. Não é um truísmo dizer que os homens devem ser homens não átomos numa massa.

Desde que o homem reconheça a extensão dos danos que causou a si próprio, ele procurará o Divino Médico para curá-lo. Foi para os homens-massa exaustos que Ele enviou o seu apelo:

“Vinde para mim todos os que trabalham e estão sobrecarregados, pois encontrarão alívio para suas almas”.

domingo, 21 de agosto de 2022

SERVO DE DEUS NICHOLAS BLACK ELK "ALCE NEGRO"


SERVO DE DEUS NICHOLAS BLACK ELK "ALCE NEGRO", Leigo, indígena Sioux, catequista conhecido entre os jesuítas como um "segundo São Paulo" e um "fervente apóstolo" pela sua evangelização entre os Lakota. Ele viveu sua fé através da tradição Lakota e levou ao catolicismo estas culturas convertendo centenas quando morreu.
Nascido em 01 de dezembro de 1863 no Rio Powder, Estados Unidos. Com cerca de 12 anos, participou da batalha de Little Big Horn de 1876, e foi ferido no massacre de Wounded Knee em 1890.
Alce Negro casou com sua primeira mulher, Katie War Bonnett, em 1892. Ela se converteu ao catolicismo e seus três filhos foram batizados. Após sua morte em 1903, Alce Negro também foi batizado, tomando o nome de Nicholas Black Elk, e continuando como líder espiritual da tribo naquilo que ele não via contradição entre tradições tribais e cristianismo.
Em 1905 ele voltou a casar com uma viúva com duas filhas chamada Anna Brings White e com a qual teve mais três filhos permanecendo com ela até a morte em 1941.
No fim de sua vida,Alce Negro contou a história de sua vida e um bom número de rituais sagrados Sioux a John Neihardt e Joseph Epes Brown para ser publicado. Suas narrações obtiveram um interesse considerável do público.
No livro de John G. Neihardt, diz-se que o Sioux aos nove anos esteve inconsciente durante 12 dias e teve visões do cavalo das quatro direções que o levou à nuvem dos seis avós, ou seja, os quatro pontos cardeais mais o zênite e o nadir. Estes ensinaram-lhe os segredos de conhecer e curar. Na sua juventude foi instruído com o conhecimento dos grandes sacerdotes, incluindo Whirlwind Chaser, Black Road e Elk Head.
Com esse conhecimento, Alce Negro rezou e jejuou por grandes temporadas o que o tornou um homem sábio que recebeu visões e um poder especial para o bem de sua nação. Essa missão obcecou o Alce Negro e causou-lhe muito sofrimento, apesar de poder guiar o seu povo para o caminho sagrado, não conseguiu ver meios suficientes para fazê-lo acontecer na sua totalidade.
Durante 50 anos, Black Elk levou outros a Cristo muitas vezes derretendo sua cultura Lakota em sua vida cristã. "Esta enculturação pode sempre revelar um pouco da verdadeira natureza e santidade de Deus" desafiou as pessoas a renovarem-se, a buscar esta vida que Cristo lhes oferece. "
A vida de Alce Negro como um catequista dedicado, líder espiritual e guia "inspirou muitos a viver para Cristo pela sua própria história. " Morreu em 19 de agosto de 1950 em Pine Ridge.
Com a abertura formal de sua causa, Alce Negro agora tem o título de "Servo de Deus".
A causa de Black Elk começou oficialmente após uma petição com 1.600 assinaturas que foi apresentada à Diocese de Rapid City em 2016. O processo foi formalmente aberto no ano seguinte e obteve a aprovação unânime dos bispos americanos na sua assembleia de novembro de 2018. A fase diocesana terminou em 25 de junho de 2019.
Os últimos papéis sobre a causa de Black Elk foram apresentados por William White, um católico Lakota em formação para o diaconado e postulador diocesano desta causa para a diocese de Rapid City, no Dakota do Sul.

sábado, 13 de agosto de 2022

COMO SE PROPAGAM AS IDEOLOGIAS - João Camilo de Oliveira Torres


COMO SE PROPAGAM AS IDEOLOGIAS

Disponível: https://livraria.camara.leg.br/interpretacao-da-realidade-brasileira 


O problema, fundamental, não está em saber como um determinado cidadão adotou, de repente, uma posição ideológica – o que nos interessa é o fato de transformar-se uma doutrina em ideologia, de difundir-se afinal. Geralmente, quando lemos um livro e ele nos agrada, nos convence, nos estimula, isto significa que o autor disse, clara e explicitamente, o que já estava em nosso coração... 

Vamos estabelecer algumas das razões básicas para a transformação de uma doutrina em ideologia, razões que, igualmente, servem para explicar as motivações particulares e o nascimento das doutrinas nos mestres. Podemos fixar as razões em duas categorias básicas: 

a) psicológicas; b) sociológicas. A) Causas Psicológicas 

Há motivações psicológicas perfeitamente definidas. Talvez a mais importante das bases psicológicas para a formação de ideologias é a ligada ao ressentimento, cuja importância Nietzsche e Scheler souberam estudar em páginas clássicas. Para resumir, podemos dizer que o ressentido nega o valor daquilo que não pode atingir. O ressentido passa a considerar mau o bom, pequeno o grande, feio o belo, simplesmente por estar fora do alcance de seu poder, como a raposa da fábula que considerou verdes as inatingíveis uvas. É um caso de desvalorização de valores. Eis o que diz Scheler:

O ponto de partida mais importante na formação do ressentimento é o impulso de vingança. Já a palavra ‘ressentimento’ indica, como dissemos, que as emoções aqui referidas são emoções baseadas na prévia apreensão dos sentimentos alheios; isto é, que se trata de reações. Impulso reativo é, com efeito, o impulso de vingança, diferentemente dos impulsos ativos e agressivos, de direção amistosa ou hostil. Um ataque ou uma ofensa precede a todo impulso de vingança. Mas o importante é que o impulso de vingança não coincide, em hipótese alguma, com o impulso para o contra-ataque ou defesa, mesmo quando esta reação vá acompanhada de cólera, furor ou indignação. Quando,por exemplo, um animal agredido morde seu agressor, isto não se pode chamar vingança. Tampouco o contra-ataque imediato a uma bofetada é vingança. Dois caracteres são essenciais para a existência da vingança: um refreamento e detenção, momentâneos pelo menos (ou que duram um tempo determinado), do contraimpulso imediato (e dos movimentos de cólera e furor enlaçados com ele), e um aprazamento da contrarreação para outro momento e situação mais apropriada (‘Você não perde por esperar...’). Este refreamento, porém, é devido à previsora consideração de que a contrarreação imediata seria fatal. Um caso de sentimento de ‘importância’ vai enlaçado, pois, com esta consideração. A vingança em si é, pois, uma vivência que se baseia em outra vivência de impotência; sempre, portanto, sempre, coisa do ‘fraco’ em algum ponto. De resto pertence à essência da vingança o conter sempre a consciência de ‘isto por isto’, o não representar nunca, portanto, uma simples contrarreação acompanhada de emoções. Graças a estes dois caracteres, o impulso de vingança é o ponto de partida mais próprio para a formação do ressentimento. Nossa língua (alemã) estabelece finas diferenças. Desde o sentimento de vingança, passando pelo rancor, pela inveja e pela ojeriza, até à perfídia, corre uma gradação do sentimento e do impulso que chega à cercania do ressentimento propriamente dito. A vingança e a inveja têm objetos determinados as mais das vezes. Estes modos da negação hostil necessitam motivos determinados para aparecer; estão ligados, em sua direção, a objetos determinados, de modo que desaparecem com o desaparecimento destes motivos. A vingança conseguida faz desaparecer o sentimento de vingança, e, analogamente, o castigo daquele a quem aponta o impulso de vingança; por exemplo: o autocastigo. Também a inveja desaparece quando o bem pelo qual invejo alguém se faz meu. A ojeriza, ao contrário, é uma atitude, que não está ligada a objetos determinados, no mesmo sentido; não surge por motivos determinados, para desaparecer com eles. Antes, são buscados aqueles objetos e aqueles valores de coisas e pessoas, nos quais possa satisfazer-se a inveja. O rebaixá-lo e derrubá-lo de seu pedestal é próprio desta disposição. A crescente atenção que despertam os valores negativos de coisas e pessoas, justamente por aparecerem unidos com fortes valores positivos num e no mesmo objeto;

o deter-se nestes valores negativos, com um acentuado sentimento de prazer no fato de sua existência, converte-se numa forma fixa das vivências, na qual podem encontrar lugar as matérias mais diferentes. Em quem tem ojeriza, a experiência particular e concreta da vida toma essa forma ou estrutura, eleita como real entre a experiência somente possível. O despertar da inveja já não é o mero efeito de tal experiência, e a experiência se forma com total indiferença com relação a se seu objeto tem uma relação, direta ou indireta, com o possível dano ou proveito do indivíduo correspondente. Na ‘perfídia’, o impulso detrativo se fez mais fundo e mais íntimo ainda; está disposto sempre, por assim dizer, a saltar e adiantar-se num gesto impensado, num modo de sorrir, etc. Um caminho análogo vai desde a simples ‘alegria do mal alheio’ até a ‘maldade’; esta procura provocar novas ocasiões de alegrar-se do mal alheio, e se mostra já mais independente de objetos determinados que a alegria do mal alheio. Mas nada disto é ressentimento. São só estádios no processo de seus pontos de partida. O sentimento de vingança, a inveja, a ojeriza, a perfídia, a alegria do mal alheio e a maldade não entram na formação do ressentimento, senão ali onde não tem lugar nem uma vitória moral (na vingança, por exemplo, um verdadeiro perdão), nem uma ação ou – respectivamente – expressão adequada da emoção em manifestações externas; por exemplo: insultos, movimentos dos punhos, etc.; e se não têm lugar, é porque uma consciência, ainda mais acusada da própria impotência, refreia semelhante ação ou expressão. Aquele que, ávido de vingança, é arrastado à ação por seu sentimento, e se vinga; aquele que odeia e causa um dano ao adversário, ou, pelo menos, lhe diz ‘sua opinião’ ou o ofende diante dos outros; o invejoso que procura adquirir o bem que inveja, mediante o trabalho, a trapaça ou o crime e a violência, não incorrem em ressentimento. A condição necessária para que este surja dá-se tão só ali onde uma especial veemência destes afetos vai acompanhada pelo sentimento da impotência para traduzi-los em atividade; e então se ‘exasperam’, seja por fraqueza corporal ou espiritual, seja por temor e pânico àquele a quem se referem tais emoções. O ressentimento fica circunscrito por sua base aos servos e dominados, aos que se arrastam e suplicam, em vão, contra o guante de uma autoridade. Quando se apresenta em outros,ou existe uma transmissão por contágio psíquico – especialmente fácil para o veneno psíquico do ressentimento, extraordinariamente contagioso –, ou há na pessoa um impulso violentamente reprimido, do qual o ressentimento toma seu ponto de partida e que se resolve nesta forma de uma personalidade ‘amargada’ ou ‘envenenada’. Quando um servidor maltratado pode ‘desafogar-se’ na copa, não incorre nessa ‘venenosidade’ interna que caracteriza o ressentimento; mas sim, ao contrário, quando é preciso ‘rir na tristeza’ (como tão plasticamente diz o brocardo) e sepulta em seu íntimo os afetos de repulsa e hostilidade.2

Há ressentimentos individuais, fenômeno muito conhecido, e ressentimentos coletivos, quando minorias, mesmo maiorias, religiosas, étnicas, ou políticas, passam a adotar uma posição de negação em face de um conjunto de valores, condenados em bloco. Os fenômenos são bem conhecidos, e, talvez, não precisemos documentá-los exaustivamente – e depois das finas análises de Scheler acerca do ressentimento da formação da moral, nada se precise dizer a respeito. Caso de ressentimento muito interessante que não tem sido considerado devidamente é o das relações entre os intelectuais e a sociedade industrial, e as pessoas que o estudam geralmente o fazem em função desse ressentimento, expressando, em suas análises, exatamente a situação que deve ser estudada objetivamente. Trata-se do seguinte: numa sociedade essencialmente agrária, o intelectual, quase sempre, é um porta-voz dos agricultores, impondo-lhes, todavia, seus pontos de vista – os agricultores, não podendo exercer o poder, pela distância entre as fazendas e as cidades, não sabendo manejar facilmente os conceitos e não conhecendo os meios de ação, entregam-se em mãos dos intelectuais, que admiram. Numa sociedade industrializada, os homens de empresa, instalados no coração das cidades, sabendo manejar diretamente as alavancas do poder, reduzem os intelectuais à condição de servidores, como advogados, políticos, jornalistas, técnicos, etc. Não é curioso o fato de vermos os grandes intelectuais do século XIX hostilizarem as consequências econômicas do liberalismo? Se considerarmos lado a lado, Karl Marx, o socialista, falando em nome do proletariado, Balzac, o legitimista, falando em nome da aristocracia, vemos, sempre, o mesmo protesto contra a burguesia que subia... Ambos expressão do mesmo ressentimento do intelectual contra o homem de empresa numa sociedade industrial.

Dois exemplos, nossos, e muito interessantes: como a Abolição foi obra da Princesa Isabel, os fazendeiros começaram a votar nos candidatos republicanos – os valores próprios e essenciais da monarquia foram negados, em virtude da mágoa provocada pelo gesto da soberana... Outro: como reconhecer que a independência do Brasil foi obra da monarquia (D. Pedro I) e como isto seria, afinal, admitir a legitimidade essencial e indiscutível do regime monárquico, por motivos objetivamente fundados e livres de contestação, os historiadores republicanos se esforçam, constantemente, em retirar a importância da ação de D. Pedro, e procuram acentuar a posição do Tiradentes...

Mas não é o ressentimento a única influência psicológica na difusão das ideologias. Outra, muito importante, dá-nos a psicanálise. Os choques de vontade e os conflitos de autoridade surgidos no seio da constelação familiar não são essencialmente de fundo erótico, mas ligados às tendências de autoafirmação, criam uma série de complexos, com importantes ressonâncias políticas. Podemos dizer que há um “complexo de Bruto”, que é a atitude antirrégia sistemática e universal. Começa com a agressividade do filho contra o pai, adianta-se no aluno contra o professor, e segue para a hostilidade permanente à autoridade como tal. É notório que as rainhas são bem recebidas e que os Bourbons e os Habsburgos tiveram maiores dificuldades modernamente, não por tendências absolutistas, mas por serem mais visivelmente afirmativos como homens e como reis. Certos casos como o do Brasil são quase vertiginosos – combatia-se, em D. Pedro II, acima de tudo a projeção da figura paternal...

Um fenômeno que confirma o fato é a tolerância ao ditador em face da agressividade ao rei, mesmo tranquilos e inócuos reis constitucionais. Um ditador pode mandar matar e fuzilar; mas, como seu poder nasce de circunstâncias ligadas à vontade dos homens, podemos tirar o ditador e pôr outro no lugar. Um rei nasce feito, não depende dos homens, não é criatura da vontade nossa. Não podemos aprofundar, aqui, toda a questão das ligações entre a psicanálise e as ideologias. O fato é conhecido e basta registrá-lo. E, não fora o medo da generalização e da simplificação, poderíamos dizer que o republicanismo e todas as formas de anarquismo e anomismo derivam de uma atitude de agressividade à figura paterna, e expressão do complexo de Édipo – e a aceitação dos valores de autoridade e de lei, um sinal de harmonia tranquila com o poder paterno. Auguste Comte, que não apreciava a discussão e o debate, e tinha em santo horror o “metafisismo democrático”, não queria uma realeza hereditária, mas uma ditadura, como não queria uma religião com um Deus, mas com uma deusa – a Humanidade...

B) Causas Sociais 

A importância dos fundamentos sociais na formação e difusão das ideologias não precisa ser assinalada com muita ênfase, pois o marxismo elevou isto à condição de princípio universal, em bases por assim dizer totais e em proporções muito exageradas. O erro essencial do marxismo, no caso, pode ser capitulado em estabelecer uma ligação direta entre a classe social estritamente considerada e a ideologia e de haver transformado isto em princípio único, o que é, obviamente, falso. É, quiçá, perigoso afirmarmos existirem ideologias especificamente burguesas ou proletárias. Scheler, com mais objetividade e profundidade, fixa a questão em termos de “classe alta” e de “classe baixa”, melhor ainda, em “classe descendente” ou “classe ascendente”. Certamente há posições que podem ser tipicamente burguesas, mas podem ser de classe em luta para obtenção do poder, ou em luta para a conservação do poder. A classificação de Scheler é a seguinte:

1. Prospectivismo de los valores en la conciencia del tempo – clase baja; retrospectivismo – clase alta. 2. Punto de vista de la génesis – clase baja; punto de vista del ser – clase alta. 
3. lnterpretación mecánica del mundo – clase baja; interpretación teleológica del mundo – clase alta. 
4. Realismo (el mundo preponderantemente como “resistencia”) – clase baja; idealismo – clase alta (el mundo preponderantemente como “reino de ideas”). 
5. Materialismo – clase baja; espiritualismo – clase alta. 
6. Inducción, empirismo – clase baja; saber a priori, racionalismo – clase alta. 
7. Pragmatismo – clase baja; intelectualismo – clase alta. 
8. Visión optimista del futuro y retrospección pesimista – clase baja, perspectiva pesimista del futuro y retrospección optimista, “aquellos buenos tiempos” – clase alta.
9. Modo de pensar que busca las contradicciones o modo de pensar “dialéctico” – clase baja; modo de pensar que busca la identidad – clase alta. 
10. Pensar inspirado por la teoría del medio – clase baja; pensar nativista – clase alta.3 

É, sem dúvida, arriscado fixarmo-nos em termos de classes definidas. Tomemos a ideologia liberal democrática. Como bem viu Auguste Comte, é uma arma de demolição e teve sua razão de ser na fase de destruição do absolutismo – mas torna-se incômoda depois. O filósofo do positivismo exemplifica, com suas ideias a respeito e sua posição pessoal, um fenômeno geral. Os homens que marcharam alegremente cantando a Marselhesa tornaram-se alarmados quando ouviram outros marchando sombriamente cantando a Internacional. Os argumentos que serviram contra o Direito Divino dos Reis e os privilégios da nobreza podiam ser usados contra os burgueses. E não há saída. Como tivemos, também, a perplexidade dos políticos republicanos da França, em face das revoltas anticolonialistas. Os argelinos e outros aplicaram contra a França os mesmos argumentos que os franceses aplicaram contra os seus reis...

Como ficaria um liberal de velha guarda, um republicano histórico, em face de um plebiscito favorável, visivelmente favorável, à restauração da monarquia, ou mais gravemente ainda, que se definisse claramente em apoio a uma ditadura? A crise da política brasileira vem, grandemente, do fato de haver preferido o eleitorado em muitas eleições os homens do Estado Novo, criando, assim, geral confusão nos espíritos.

Além deste aspecto que, como vimos, Comte assinalou muito bem, tanto que era, no fim da vida, contra o “metafisismo democrático”, bom para destruir e ruim para construir, temos outro, que devemos considerar.

Primeiramente a relação campo-cidade. Está fora de dúvida que a política sofre consideravelmente das influências do caráter agrário ou urbano da população. Eleições em meio rural, em pequenas e médias cidades, e em grandes metrópoles industrializadas conduzem à formação de regimes políticos perfeitamente diferentes – são três realidades distintas. Aí entram em conta, de fato, muitos fatores – gênero de vida, concentração da população, densidade demográfica, etc. Aliás, Montesquieu já dizia que a república era o regime próprio às pequenas comunidades, a monarquia, às grandes e o despotismo, às enormes. Numa comunidade agrária, o eleitor será sempre um vassalo; nas cidades, o cidadão segundo os padrões medievais e liberais clássicos; nas metrópoles, o indivíduo-massa, simples unidade atomizada.

Basta o exemplo da propaganda: ela somente surtirá efeito em grandes concentrações. Como aplicar a propaganda aos moradores de uma comunidade reduzida, principalmente de uma comunidade rural, de casas esparsas? Modernamente o rádio permite uma propaganda atingindo o meio rural, mas aí temos todos os moradores de uma região e de um país – não os membros da mesma comunidade rural. Não será a propaganda aplicada aos moradores do vale do rio Tanque – mas a todos os lavradores do vale do rio Doce. Um candidato local não poderá usar da propaganda, embora possa conversar com todos os homens. Um candidato nacional poderá aplicar a propaganda – mas aí a região se diluirá na confusão geral. (O rádio está permitindo um fenômeno novo – a massificação de indivíduos separados, a formação de multidões de indivíduos que se ignoram, mas que estão sujeitos aos mesmos fenômenos que fazem a psicologia das multidões.)

A difusão, portanto, de uma ideologia que, em linguagem filosófica, deve ser identificada à doxa, ou “opinião”, dos antigos, depende, portanto, de circunstâncias diversas, não da força probante dos raciocínios, aos quais, em geral, ninguém dá muita importância.

Certamente não se poderá, nunca, fixar as razões concretas pelas quais um determinado sujeito adota esta ou aquela posição, mas podemos achar perfeitamente natural que um comerciante, que se fez por seu esforço, seja republicano e que um agricultor, cuja riqueza depende de fatores naturais, do tempo, das estações, da fecundidade da terra e dos animais, seja monarquista, por ser um modo de sucessão que segue os mesmos processos que a natureza.

A definição de uma pessoa concreta ou de uma certa categoria de indivíduos, vale dizer, uma classe, relativa a uma posição política, é uma afirmação de valores e, assim, está ligada a estados afetivos. Certamente são estados afetivos que determinam os valores que aceita uma pessoa, são eles que revelam os valores. Toda a obra de Scheler – e é o filósofo por excelência destas questões – nos diz em muitos tons e acordes a mesma coisa: os valores nos são dados por nossos estados afetivos, é o amor ou ódio que revelam o valor ou o desvalor de uma coisa. Ora, as razões que levam o homem a amar ou a odiar concretamente nos são desconhecidas – só Deus, “que sonda os rins e o coração dos homens”, pode saber, efetivamente, como e porque um homem determinado formulou a decisão valorativa concreta. 

Ninguém, esta a verdade, se define racionalmente a respeito de regimes e soluções políticas, mas pelas razões do coração – daí preferirem os homens as ilusões da liberdade à liberdade efetiva, daí preferirem um mau governo que se funda em motivos passionais, no ódio ao estrangeiro, aos “burgueses”, aos “judeus”, ou a qualquer outra espécie de bode expiatório, a um governo racional que nos resolva os problemas, mas não nos aquece o coração. Daí Salvador de Madariaga, com desconsolada filosofia de castelhano, dizer que “países excessivamente bem administrados produzem o tédio”. Não é importante o fato de que o “securitismo” escandinavo, que resolveu os problemas sociais e econômicos de nosso tempo, não despertar entusiasmo nos jovens, nem ter produzido farta literatura, embora apresentando soluções verdadeiramente revolucionárias, enquanto o regime de Fidel Castro, que nada resolveu até agora, e ter cometido crimes vários, seja a coisa mais conhecida da América Latina, hoje? A razão é simples: na Suécia adotam soluções frias, como o gelo – embora resolvendo. Castro fala às paixões dos homens, e não às inteligências... E em política, como em qualquer atividade ligada à fixação de valores, “o coração tem razões que a inteligência desconhece”. 

Notas 
1. M. Scheler, Le Sens de la Souffrance. Paris, 1936, p. 176-177. 
2. Apud Luís Washington Vita, Momentos Decisivos do Pensamento Filosófico. S. Paulo, 1964, p. 426. 3. M. Scheler, Sociologia del Saber. B. Aires, 1947, p. 192. 

quarta-feira, 13 de julho de 2022

JOHN HENRY NEWMAN (1801-1890) - Relato de conversão

Este relato foi extraído do livro Voltando Para a casa, da Editora Santo Thomas More. Agradecemos a autorização. 

JOHN HENRY NEWMAN (1801-1890) 

Nascido no seio de uma família anglicana48 de banqueiros, em Londres, a 21 de fevereiro de 1801, John Henry Newman passou por uma “primeira conversão” (como ele a chamou) aos 15 anos. Em 1825, após completar seus estudos em Oxford, foi ordenado sacerdote anglicano. Três anos depois foi nomeado vigário da igreja de Santa Maria, anexa à Universidade de Oxford. 

Nesse cargo, que ocupou até 1843, ele cultivou amizade com pessoas instruídas e sábias da Inglaterra da época. Foi o promotor, a partir de 1833, do “Movimento Oxford”, corrente religiosa dentro da Igreja Anglicana que promovia um “meio-termo”, uma terceira via, entre o Protestantismo e a Igreja Católica. Em sua autobiografia, Newman diz o seguinte: “Posteriormente, e sem ser capaz de especificar a ordem ou as datas em minhas palavras, falei da Igreja de Roma como ligada à causa do anticristo (“um dos muitos anticristos”), ou como uma Igreja que tinha em si algo “não cristão”, ou “verdadeiramente anticristão”.

Mas, estudando a história dos hereges monofisistas e arianos, ele percebeu que não poderia manter essa terceira via e que deveria ou permanecer anglicano, ou se tornar católico de uma vez por todas. Newman enfrentou muitas lutas internas e, para ser fiel à sua consciência, teve de trabalhar duro para investigar a verdade nos livros dos Santos Padres da Igreja dos primeiros séculos, até que, gradualmente, descobriu o verdadeiro caminho. 

Em 1843, decidiu deixar o cargo de pastor anglicano e foi reduzido a um simples leigo, embora ainda não estivesse decidido a se tornar católico, devido a obstáculos como a devoção à Virgem e aos santos: “Em 1843, dei dois passos muito importantes: 1) Em fevereiro, fiz uma retratação formal de todas as coisas duras que havia dito contra a Igreja de Roma. 2) Em setembro, abdiquei do benefício concedido a mim na igreja de Santa Maria, em Littlemore”, diz Newman. 

“Entre o outono de 1843 e 1845, permaneci em comunhão leiga com a Igreja da Inglaterra, frequentando, como de costume, seus atos de culto e me abstendo completamente de lidar com os católicos e seus ritos e práticas religiosas, como a invocação dos santos (que são característicos de seu credo). Eu fazia tudo isso por convicção, porque nunca consegui entender como alguém pode pertencer a duas confissões religiosas ao mesmo tempo”, escreveu o ex-sacerdote anglicano. Em 9 de outubro de 1845, ele abraçou o catolicismo. 

Eis o depoimento de John Henry Newman sobre sua conversão: “A partir do momento em que me tornei católico, naturalmente não tenho mais histórias de minhas ideias religiosas para contar. Ao dizer isso, não quero dizer que meu entendimento tenha ficado ocioso ou que parei de pensar em questões teológicas, mas que não tenho contratempos e não tive angústia no coração. Tenho estado em perfeita paz e contente, e nunca tive dúvidas. Ao me converter, não notei nenhuma mudança, intelectual ou moral, operando em meu espírito... Tampouco senti mais fervor. Foi como chegar ao porto depois de uma tempestade, e a felicidade que então senti permanece ininterrupta até o presente. 

“Nunca fiquei constrangido com a aceitação dos artigos adicionais, que não são encontrados no credo anglicano. Alguns eu já acreditara, mas nenhum deles foi uma prova de fogo para mim. Ao ser recebido na Igreja Católica, professei- -os com a maior facilidade, e sinto o mesmo quando penso sobre eles hoje em dia. 

“Falarei da doutrina que os protestantes consideram a maior dificuldade: a da Imaculada Conceição de Maria, que afirma que a Bem-Aventurada Virgem Maria foi concebida sem o pecado original. Na verdade, cai por si mesma a afirmação de que os católicos passaram a acreditar porque foi definido, pois ocorreu justamente o contrário: foi definido porque acreditavam. Longe de ser uma decisão, uma imposição tirânica ao mundo católico, sacramentada em 1854, foi recebida em toda parte, quando promulgada, com o maior entusiasmo. A definição foi feita a partir do pedido unânime de toda a Igreja à Santa Sé, pois que o dogma sobre a Concepção Imaculada de Maria surgiu ainda na época apostólica”. 

Após uma viagem a Roma em 1847, Newman foi ordenado padre católico. Um de seus principais objetivos, então, foi mostrar aos ingleses que se pode ser um bom católico e um cidadão leal. O Papa Leão XIII o nomeou cardeal em 1879. 

Junto com ele, converteram-se 22 sacerdotes anglicanos e 11 professores da Universidade de Oxford e de Cambridge. Estima-se que, desde a conversão de Newman, em 1935, 900 reverendos episcopais tornaram-se católicos.


Os anglicanos têm como líder de sua igreja a rainha ou o rei da Inglaterra. Dentro da hierarquia eclesiástica britânica, após a família real, vêm: o parlamento inglês e o arcebispo de Canterbury. É, deste modo, uma igreja dirigida pela autoridade civil. A Igreja Anglicana aceita o divórcio, visto que, para ela, o casamento não é indissolúvel.



Para comprar: https://livrariaborasersanto.com.br/santo-thomas-more/voltando-para-casa 

Esta obra, que o leitor tem agora em mãos, mais do que uma série de histórias aponta um caminho seguro para se aprofundar na Fé Católica. Chamo a atenção para um ponto, do fenômeno da Conversão: é possível ocorrer "conversões" para o erro, a mentira... assim aconteceu aos nossos primeiros pais, assim está profetizada nos últimos dias, assim ocorreram tantas que abandonaram a Santa Igreja. Porém a genuína conversão é para a verdade, e comparando tantas conversões, reconhecemos que uma genuína conversão só pode ocorrer se ela for fundamentada na VERDADE, e por isso ela se caracteriza por ser lógica e racional.

Enquanto conhecemos conversões que somente ocorreram por meio de acontecimentos emocionais, revoltosos ou por mera conveniência, o leitor terá histórias cujos personagens entraram no caminho de um estudo sincero, racional superando gostos e emoções e aceitando os fatos e verdades que se verificam com suas consequências e na maior das provas o FRUTO como já havia apontado Jesus no Sermão da Montanha. Ainda que a Verdade toque a realidade Sobrenatural, essa está analogicamente ligada as realidades visíveis e racionais.

Pe. Reinaldo Aparecido Bento



Ficha Técnica:
ISBN: 9788553019199
Editora: Santo Thomas More
Dimensões: 14.00 x 21.00 cm
Idioma: Português
Páginas: 194