sábado, 24 de março de 2012

Deus não faz pobres - Beato Frederico Ozanam


Habituados até agora a considerar unicamente o interesse temporal no governo dos homens, os políticos só procuram as causas da miséria na desordem material. Formaram-se assim duas escolas que reproduziram todo o problema social à produção ou à distribuição das riquezas. De um lado, para a antiga escola dos economistas, a maior catástrofe social é uma produção insuficiente e a única solução é acelerá-la, multiplicá-la, através de uma concorrência ilimitada; não há outra lei do trabalho além do interesse pessoal, que é o mais insaciável tirano. De outro lado, a escola dos socialistas modernos vê toda a raiz do mal numa distribuição viciosa dos bens e crê salvar a sociedade suprimindo a concorrência, fazendo da organização do trabalho uma prisão destinada a alimentar seus prisioneiros e ensinando ao povo a aceitar a barganha de sua liberdade pela certeza do pão e a promessa do prazer.

Esses dois sistemas, por caminhos diversos, chegam ao mesmo materialismo. Um reduz o destino humano a produzir; outro, a gozar. Não sabemos se temos mais horror daqueles que humilham os pobres, os operários, a ponto de transformá-los em instrumentos da fortuna dos ricos, do que daqueles que os corrompem até lhes inocular as paixões dos maus ricos.

[...] Deus não faz pobres, não envia criaturas humanas às contingências desse mundo, sem as prover de duas riquezas que são as fontes das demais: a inteligência e a vontade. As riquezas morais tanto são a origem de todas as outras que as coisas materiais só se transformam em riquezas quando atingidas pela inteligência que as elabora e pela vontade que as utiliza... Por que pois pretender esconder ao povo aquilo que ele está farto de saber? Por que querer lisonjeá-lo, como se fazia com os tiranos?

É a liberdade humana que faz os pobres. É ela que seca essas duas fontes primitivas de toda riqueza, a inteligência e a vontade, deixando a primeira se extinguir na ignorância e a segunda se extenuar na devassidão.
ANTOINE FRÉDÉRIC OZANAM, trecho de artigo publicado L'Ere Nouvelle,
Paris, outubro de 1848.

Fonte: NUEC

sábado, 17 de março de 2012

Até os políticos vão para o Paraíso...

Entrevista com o cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Não por acaso, Paulo VI definiu a política como “a mais alta forma de caridade”


de Gianni Cardinale


O cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos
O cardeal José Saraiva Martins, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos
Os cinqüenta anos da morte de Alcide De Gasperi, cujo processo de beatificação está em andamento - ainda em nível diocesano -; o acesso às honras dos altares de Alberto Marvelli, membro da Ação Católica e assessor da Democracia Cristã de Rímini nos primeiros anos do pós-guerra; a beatificação de Carlos de Habsburgo, último imperador da Áustria: o conjunto desses acontecimentos oferece o ponto de partida para discutir as relações entre santidade e política. 30Dias falou disso com o cardeal José Saraiva Martins, que desde 1998 dirige a Congregação para as Causas dos Santos. O purpurado português mostra-se particularmente interessado, e preparado, sobre o tema, mesmo porque está concluindo um relatório aprofundado sobre o assunto a ser apresentado em outubro na Associação Internacional “Caridade Política”, fundada pelo professor Alfredo Luciani.

Antes de responder às perguntas, o cardeal Saraiva Martins considera oportuno precisar um aspecto. “Eu gostaria de esclarecer”, nos diz, “que minha reflexões sobre a santidade no exercício de uma atividade política se referem exclusivamente aos leigos cristãos. De fato, só eles têm como vocação própria na Igreja ‘buscar o reino de Deus na gestão das coisas temporais’. Já a condição dos sacerdotes, dos religiosos e das religiosas exige uma dedicação exclusiva à missão que lhes é própria, o que comporta o dever de abster-se - em condições ordinárias - de atividades políticas, econômicas ou sindicais”.



Eminência, a política é também a arte do compromisso. Santidade e compromisso são compatíveis?


JOSÉ SARAIVA MARTINS: O uso da palavra “compromisso” pode ser fonte de confusões. Poderia também ser entendida como negociata, até mesmo em prejuízo da verdade e da justiça. E, se fosse assim, toda a classe política seria automaticamente desqualificada. Todavia, é verdade que, na atividade política, quase nunca é possível alcançar tudo o que se pretende. Em primeiro lugar, Deus estabeleceu uma ordem do universo na lei eterna ou direito natural, mas, dentro dessa moldura, quis a colaboração livre e responsável dos homens, segundo os ditamos da própria consciência retamente formada, ao levar a termo no tempo a obra da criação. A observância da lei natural e a liberdade responsável do indivíduo são, portanto, elementos inseparáveis, e constituem juntos o estatuto desejado por Deus para o agir do cristão na esfera temporal. Se as soluções para todos os casos possíveis estivessem preestabelecidas, a liberdade e, portanto, também a dignidade do homem seriam deixadas de lado, e nem se poderia mais falar de História, mas apenas de um rígido determinismo. Ora, quando há mais de uma posição legítima, a ninguém é lícito tentar impor aos outros as próprias opiniões, e será preciso chegar a uma decisão que seja o resultado de um confronto honesto e aprofundado dos diversos pareceres.


Portanto, para um político católico é possível aprovar leis não perfeitamente aderentes à doutrina católica?


SARAIVA MARTINS: Nos parágrafos 73 e 74 da encíclica Evangelium vitae, João Paulo II sugere a hipótese de um parlamentar que, diante de uma lei lesiva ao direito à vida que não pode ser completamente revogada - e o mesmo vale para as leis contrárias à dignidade e à estabilidade da família ou para tantas outras semelhantes -, pode e às vezes deve “oferecer o próprio apoio a propos­tas que visassem limitar os danos de uma tal lei e diminuir os seus efeitos negativos no âmbito da cultura e da moralidade pública”, desde que seja clara e conhecida por todos sua oposição pessoal a tal lei. Eu me limito a acenar à questão, que exigiria outras explicações. Mas nem nesse caso penso que se possa falar de compromisso.

Robert Schuman com Alcide De Gasperi
Robert Schuman com Alcide De Gasperi

É possível para os políticos serem também santos?


SARAIVA MARTINS: Certamente. O chamado universal à santidade diz respeito obviamente também aos políticos, como afirma o Concílio Vaticano II na constituição apostólica Lumen gentium: “É, pois, claro a todos, que os cristãos de qualquer estado ou ordem são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade”. O fato de o chamado se realizar já é um outro passo. A atividade dos políticos deve estar a serviço do bem comum. É evidente, portanto, que quem a exerce pode se santificar e também que a própria atividade política pode e deve ser santificada. É, portanto, motivo de alegria o fato de que muitos leigos participem da política ativamente, segundo suas condições e possibilidades. Não por acaso, Paulo VI definia a política como “a mais alta forma de caridade”.


As causas de canonização dos homens políticos são mais complicadas do que as outras?


SARAIVA MARTINS: Por si mesmas, não são mais complicadas. A Igreja não canoniza um sistema político, mas a pessoa que praticou heroicamente as virtudes e que, portanto, no campo específico da política, agiu em conformidade com a fé, com verdadeira competência e na busca contínua do bem da sociedade, não dos próprios interesses. A maior complexidade pode vir, como também em outras causas, quando se trata de políticos cuja atividade teve ressonância em nível internacional ou internacional, em cujo caso será preciso situar a pessoa em seu contexto histórico e social, ao passo que em outros casos - pense-se, por exemplo, numa mãe de família que viveu o cotidiano num âmbito geográfico restrito - bastará uma descrição mais geral do ambiente no qual transcorre a vida do candidato à canonização.


O santo patrono dos políticos é São Tomás Morus. Poderíamos pensar, assim, que o martírio é o único caminho para um político se tornar santo...


SARAIVA MARTINS: Os políticos, também aqueles que aspiram à santidade, podem ficar tranqüilos. Não é necessário que aspirem necessariamente ao martírio... Qualquer fiel cristão que se tenha dedicado à política pode ser declarado santo. Pessoalmente, considero que Tomás Morus poderia ter sido canonizado mesmo que não tivesse sido mártir.

O imperador Carlos de Habsburgo com seu séquito durante a procissão de <I>Corpus Christi</I> pelas ruas de Viena
O imperador Carlos de Habsburgo com seu séquito durante a procissão de Corpus Christi pelas ruas de Viena

Há figuras de políticos santos que lhe são particularmente caras?


SARAIVA MARTINS: Eu não gostaria de exprimir preferências. Permito-me apenas assinalar a figura do último “político” beatificado, Alberto Marvelli, o qual, além de ser ex-aluno salesiano e um associado da Ação Católica, foi também assessor da Democracia Cristã no município de Rímini.


O que o impressionou particularmente na figura do beato Marvelli?


SARAIVA MARTINS: Duas coisas em particular. Em primeiro lugar, sua entrega total e sem medo a Jesus Cristo, não de maneira abstrata, mas tendo sempre em mente a frase de Jesus: “O que fizerem ao menor de meus irmãos, o tereis feito a mim”. Marvelli foi um grande apóstolo dos pobres. E depois a percepção do fato de que não é a habilidade ou a ação do político, mas somente a graça do Senhor que provê o bem de um Estado. Escrevia o beato Alberto: “Não fizemos nada pelas eleições, temos de trabalhar em profundidade. Em alguns lugares, trabalha-se muito, mas não se faz nada. É preciso trabalhar na graça de Deus...”.


Algumas declarações que o senhor fez em favor da santidade de De Gasperi, durante o “Acampamento dos jovens” organizado no santuário de San Gabriele dell’Addolorata, em Abruzzo, no final de agosto, viraram notícia. O senhor quer acrescentar alguma coisa?


SARAIVA MARTINS: Para lhe responder, recorro às palavras do beato cardeal Ildefonso Schuster, que, há cinqüenta anos, morreu poucos dias depois de De Gasperi. Quando o Arcebispo de Milão recebeu a notícia da morte do estadista de origem trentina, comentou: “Desaparece da terra um cristão humilde e leal que deu da sua fé testemunho inteiro em sua vida particular e na vida pública”. Para uma pessoa medida como Schuster, parece-me um elogio significativo, que confirma sua liberdade de juízo. Por ocasião do cinqüentenário da morte, vêm sendo destacadas mais as grandes qualidades de De Gasperi, sua partilha plena e convicta com Robert Schuman [cuja fase diocesana do processo de beatificação terminou, ndr.] do projeto de uma verdadeira integração européia. As causas de beatificação de ambos, porém, são úteis para aprofundar ainda mais a sua arraigada e vivida espiritualidade cristã. Li com interesse o que o cardeal Angelo Sodano sublinhou, ou seja, como em De Gasperi “virtude religiosa e virtude civil se uniram a serviço do compromisso político”. Há uma frase muito bela, que hoje tem um caráter profético, escrita pelo servo de Deus Alcide a sua esposa, Francesca: “Há homens de posse, homens de poder, homens de fé. Eu gostaria de ser lembrado entre estes últimos”.


As causas de beatificação de políticos modernos parecem voltar-se exclusivamente a personalidades de origem popular/democrata-cristã (Marvelli, Schuman, De Gasperi...). Deve ser necessariamente assim?


SARAIVA MARTINS: Graças a Deus, a santidade não tem carteirinha. De nenhum gênero. A única lei de Deus válida para um político cristão baseia-se em dois eixos: de um lado, a lei natural entendida segundo as declarações do magistério da Igreja, que admite uma pluralidade de soluções concretas em cada caso; por outro, a decisão livre e responsável do interessado, que, na busca do bem da sociedade, segue os ditames da consciência retamente formada. A Igreja, portanto, nunca pode canonizar um sistema político concreto, nem, obviamente, pode dar preferência a particulares formas de partido. O sujeito da canonização é o político que, em sua atividade, pratica as virtudes em grau heróico, entre as quais o reto exercício da sua liberdade.

Alberto Marvelli, membro da Ação Católica e assessor democrata-cristão do município de Rímini nos primeiros anos do pós-guerra, beatificado em 5 de setembro de 2004. À direita, João Paulo II em Loreto, durante a cerimônia de beatificação de Marvelli
Alberto Marvelli, membro da Ação Católica e assessor democrata-cristão do município de Rímini nos primeiros anos do pós-guerra, beatificado em 5 de setembro de 2004. À direita, João Paulo II em Loreto, durante a cerimônia de beatificação de Marvelli

Em 3 de outubro foi beatificada uma figura política de outros tempos, Carlos de Habsburgo, último imperador da 
Áustria. O fato de ser um nobre foi uma vantagem ou desvantagem para os procedimentos de sua causa de beatificação?


SARAIVA MARTINS: Todos os membros da Igreja são filhos de Deus convidados a viver a vida de Cristo e participantes do mesmo chamado universal à santidade. Essa é a única nobreza que conta diante do Senhor. Portanto, com relação a ele não houve nenhuma particular deferência de natureza mundana.


A beatificação de Carlos de Habsburgo não poderia suscitar perplexidade em populações que não se lembram com prazer do Império Austríaco?


SARAIVA MARTINS: Com a proclamação a beato de Carlos de Habsburgo, declara-se a santidade de vida de um fiel cristão que praticou as virtudes em sua situação de imperador. Isso não comporta nenhum juízo de mérito acerca da bondade de suas opções concretas em matéria política. A causa não diz respeito ao Império Austro-Húngaro, mas a uma pessoa. Nem diz respeito a um particular sistema político. A Igreja, repito, não canoniza nenhuma forma institucional...


Nem a democracia?


SARAIVA MARTINS: Nem a democracia é perfeita. Basta lembrar o simples fato de que Adolf Hitler foi eleito democraticamente... A Igreja, como diz o Papa na Centesimus annus, respeita a legítima autonomia da ordem democrática e não tem autoridade para exprimir preferências por uma ou outra solução institucional.

Fonte: 30 dias

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

sábado, 24 de setembro de 2011

A relação da Igreja com o Estado



A relação da Igreja com o Estado

Pelo Beato João Paulo II*

As tarefas missionárias da Igreja são realizadas em uma sociedade concreta e no território de um determinado Estado. Como vê, Santo Padre, a relação da Igreja com o Estado na situação atual?

Lê-se na constituição Gaudium Et Spes: “No domínio próprio de cada uma, comunidade política e Igreja são independentes e autônomas. Mas, embora por títulos diversos, ambas servem a vocação pessoal e social dos mesmos homens. E tanto mais eficazmente exercitarão este serviço para bem de todos, quanto melhor cultivarem entre si uma sã cooperação, tendo igualmente em conta as circunstâncias de lugar e tempo. Porque o homem não se limita à ordem temporal somente; vivendo na história humana, fundada sobre o amor do Redentor, ela contribui para que se difundam mais amplamente, nas nações e entre as nações, a justiça e a caridade. Pregando a verdade evangélica e iluminando com a sua doutrina e o testemunho dos cristãos todos os campos da atividade humana, ela respeita e promove também a liberdade e responsabilidade política dos cidadãos.”(nº 76) O significado que o Concílio dá ao termo “separação” entre a Igreja e o Estado está muito longe daquele que lhe quereriam atribuir os sistemas totalitários, tendo isso constituído, sem dúvida, uma surpresa e, em certo sentido, também um desafio para numerosos países, especialmente governados por regimes comunistas. É claro que estes regimes não podiam rejeitar tal posição do Concílio, mas ao mesmo tempo davam-se conta de que a mesma colidia com o conceito que tinha de separação entre Igreja e o Estado; de fato, na visão deles, o mundo pertence exclusivamente ao Estado, enquanto a Igreja tinha o seu âmbito próprio fora, por assim dizer, das “fronteiras” do mundo. A perspectiva conciliar sobre a Igreja “no”  mundo rejeita tal interpretação: para a Igreja, o mundo é uma tarefa e um desafio; ele o é para todos os cristãos, mas de modo particular para os católicos leigos. O Concílio abordou com decisão a questão do apostolado dos leigos, isto é, da presença ativa dos cristãos na vida social. Ora, precisamente este âmbito, segundo a ideologia marxista, deveria constituir domínio exclusivo do Estado e do partido.

Não é inútil recordar isto, porque hoje há partidos que, não obstante a sua matriz seguramente democrática, mostram uma crescente propensão para interpretar o princípio da separação entre Igreja e o Estado segundo a visão própria dos governos comunistas. Naturalmente, agora as sociedades dispõem de meios adequados de autodefesa; devem apenas querer aplicá-los. Mas, precisamente a tal respeito, suscita preocupação uma certa passividade que se nota no comportamento dos cidadãos crentes; dá a impressão de que eles outrora tinham uma sensibilidade mais viva dos seus direitos na visão no âmbito religioso e, conseqüentemente, uma propensão mais pronta para defendê-los com os meios democráticos ao seu dispor. Hoje, tudo isto aparece de certo modo atenuado, senão mesmo refreado, devido talvez a uma insuficiente preparação das elites políticas.

No século XX, muit se fez para que o mundo deixasse de crer e rejeitasse Cristo; no declinar do século – e simultaneamente do milênio -, tais forças destrutivas debilitaram-se, deixando, porém, atrás de si uma grande devastação: trata-se de uma devastação das consciências, com conseqüências calamitosas nos âmbitos da moral tanto pessoal como familiar, bem como da ética social. Os pastores de almas, que estão diariamente em contato com a vida espiritual do homem, sabem disso melhor que ninguém; quando tenho ocasião de falar com eles, ouço freqüentemente confissões assustadoras, a ponto de, nesta transição de milênio, se poder infelizmente designar a Europa como o continente das devastações. Os programas políticos, orientados primariamente para o progresso econômico, não bastarão sozinhos para curar tais chagas; pelo contrário, podem até agravá-las. Aqui abre-se à Igreja um campo enorme de trabalho; a colheita evangélica, tal como se apresenta no mundo contemporâneo,  é verdadeiramente grande, é preciso suplicar ao Senhor – e com insistência – que mande trabalhadores para esta colheita à espera de ser recolhida. 

Trecho retirado do livro: Memória e Indentidade, autoria de João Paulo II. Publicado pela editora Objetiva, 2005. Capítulo 20 A relação da Igreja com o Estado. página 136. 

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Ateísmo...“O esgoto do Universo”

AGOSTINO NOBILE
Publicado no Jornal da Madeira

Evidentemente, nem Mussolini, nem Savater conhecem a Patrística Cristã. Mas eles não conhecem nem um pouco de filosofia, de outra maneira ele já tinha a resposta à sua pergunta superficial. No seu livro "O Conceito de Deus depois de Auschwitz" o filósofo Hans Jonas dá a resposta sensata a esta pergunta ateísta banal: «A omnipotência de Deus está ausente, a partir do momento que ele fez o homem livre.»

O ateu, como muitas vezes os crentes que seguem os ensinamentos dos ateus, é basicamente uma pessoa sem princípios, ou seja, os seus princípios mudam de acordo com os eventos. A primeira coisa que emerge das suas teses é a total falta de humildade. Ele é especialmente reconhecido pela sua fé trinitária terrena: Sucesso, Dinheiro e Sexo. Ele ama - como um verdadeiro crente pode amar a Deus - ou o ateu de sucesso, ou melhor o ateu que se torna num mito qualquer. Ele está pronto a humilhar-se também para aparecer numa foto junto com o "mito", ostentando a fotografia orgulhosamente na sua sala. A falta de fé no Absoluto leva para deificar a sua “trindade”, ou o seu trabalho, a arte, o desporto, etc.... Ele adora mostrar a sua “cultura”, ou a sua importância social, estampando-a sem vergonha no rosto do seu interlocutor. É uma pessoa que vive os momentos superficiais, das emoções, de aprovações, mas quando envelhece se os companheiros ateus o esquecem, ele torna-se triste, tão triste até à depressão.

O escritor ateu espanhol Fernando Savater, está convencido que hoje, é a religião «a buscar o apoio da ética laica, (...) os nossos valores democráticos e ocidentais não são protegidos pela teocracia Vaticana, mas pelos valores resumidos no conceito de laicismo institucional.» O que significa “laicismo institucional"? Nada. Parece que a laicidade nasceu do nada. A laicidade foi criada por Jesus Cristo (dar a César...), é precisamente a laicidade baseada nos valores cristãos. Os Direitos Humanos, por exemplo, sem o cristianismo não existiriam (como nos países ateus e de outras religiões).

Um outro ateu, Sam Harris, no seu livro “Carta a uma nação cristã” pretende demolir as «pretensões intelectuais e morais feitas pelo cristianismo.» Essa pessoa “culta” escreve: «Um homem pode sequestrar uma criança, logo a estuprará, a torturará e depois mata-a.» Os pais estão convencidos que «uma atenção amorosa e omnipotente de Deus está sobre eles e suas famílias.» Na realidade isso não acontece, então, para Harris, Deus não existe. Este homem acredita que o Criador seja uma baby sitter, e como uma baby sitter teria (talvez) evitado o crime. Portanto, Deus não existe. O senhor Harris lembra-nos Benito Mussolini, que olhando o relógio desafiou Deus, exclamando, mais ou menos «se num minuto Você não me fulmina, significa que Você não existe!» Evidentemente, nem Mussolini, nem Savater conhecem a Patrística Cristã. Mas eles não conhecem nem um pouco de filosofia, de outra maneira ele já tinha a resposta à sua pergunta superficial. No seu livro "O Conceito de Deus depois de Auschwitz" o filósofo Hans Jonas dá a resposta sensata a esta pergunta ateísta banal: «A omnipotência de Deus está ausente, a partir do momento que ele fez o homem livre.»

O famoso ateu Richard Dawkins, um filho digno dos piores regimes totalitários, depois de alguns sucessos editoriais, publica “O Maior Espectáculo da Terra - As Evidências da Evolução ". Em 400 páginas particularmente chatas, o autor tenta demonstrar "cientificamente" que o homem é o neto do macaco. Desde que os darwinistas consideram os seus próprios livros - erroneamente - "científicos", seria útil para os editores publicá-los como textos religiosos, a saber, livros de fé. Também porque este tipo de ateu é um dos piores fundamentalistas do Ocidente. Nenhum cientista sério poderia considerar “ciência”, o que hoje é considerado inferior a uma teoria. Aliás, Dawkins promove o “Projecto Grandes Primatas Antropomórficos” que visa estender os direitos humanos aos grandes primatas antropóides principais. Se eles implementarem essa ideia, amanhã os ateus podem casar-se com os macacos, e talvez pedir a assistência social para arranjar um ninho de amor. Então, se o casamento funciona, intelectualmente e sexualmente, eles podem pedir a adopção de pequenos humanos e chimpanzés para fazê-los crescer como irmãos, possivelmente em cima das árvores. Os ateus dizem que o ser humano para satisfazer a sua necessidade de amenizar os seus medos, inventou as religiões. O homem primitivo teria criado um ser superior porque tinha medo da fome, da doença e da morte. Esquecendo a “nata” dos ateus e deístas como Voltaire, há que referir que ele em seu leito de morte pediu a bênção de um padre católico. No final do século XIV, apenas na Ordem Beneditina haviam recebido ordens monásticas vinte imperadores, dez imperatrizes, quarenta e sete reis, cinco rainhas. No mundo moderno é suficiente recordar os físicos Max Planck e Albert Einstein, dois grandes cientistas que acreditavam em Deus. De facto, hoje quem comanda são os “sacerdotes” ateus, que nos fizeram voltar ao tribalismo. Olhemos em redor, com que é que nos deparamos? Anéis no nariz, no umbigo, nos lábios, nos mamilos, na vagina. Tatuagens multicolores que atingem as nádegas. Moda que nos faz recuar ao período pré-mosaico. A isso adicionamos: violência escolar, a escravidão e a prostituição a nível global, violência doméstica, nas ruas e nas escolas. A família diz que a escola está ausente, enquanto a escola acusa a família de não saber educar. Parece que ninguém percebeu a ausência de Deus. A crise económica actual não é acidental, porque na verdade é a ética que está em crise profunda. Sem o temor de Deus o homem torna-se lentamente como o descreveu o ateu Charles Bukowski: "o homem é o esgoto do universo”. Isso é inevitável, nos diz a história.

Apesar do que vemos, os ateus acreditam que o homem é "naturalmente" bom, sem Deus. O que é bondade? Se um muçulmano se divorcia “legitimamente" das suas esposas e filhos com uma mensagem de texto, para um cristão não é considerado bom. Se para um agricultor da Índia ou da China é indiferente matar uma criatura só porque nasceu do sexo feminino, para um cristão não é. Se para um ateu é indiferente matar uma
criatura no útero da mãe, para um cristão não o é.

Primo Levi, no seu livro “É isso um Homem?”, descreve a sua experiência nos campos de concentração nazis. Terrível! Os torturadores usavam a lei ateísta nazi, onde o homem era considerado simplesmente matéria. No livro "Música para os lobos", Dario Fertilio descreve as torturas monstruosas realizadas numa prisão da Roménia entre 1949-1952. Basta dizer que a tortura menos violenta era aquela que forçava a vítima a comer excrementos. Os carcereiros cumpriam as leis dos ateus comunistas, onde o corpo do homem, obviamente, não é sagrado. Na China, acontece que os militares constrangem as mulheres grávidas a abortar com pontapés na barriga. Outras leis ateias comunistas. As experiências de horror das ideologias ateias do século passado, que também continuam hoje, não foram suficientes para os ateus como Dawkins. Sem os valores cristãos, os laicos tornam-se cada vez mais "o esgoto do universo". Os homens de todas as culturas e religiões cometem injustiças, mas quando as injustiças se tornam Lei, morre o sentido da vida. O homem fica prisioneiro das legislações decididas por outros homens. No final nós estamos numa situação pior do que a selva. Os animais matam para a sua própria defesa e para a sua sobrevivência. Para os homens que se consideram melhores do que outros, isto não é suficiente. Muitas vezes eles gostam de matar a tua dignidade, a tua inteligência, os teus sentimentos, a tua família, a tua natureza, a tua alma. Hoje, os governos ocidentais estão fazendo exactamente o mesmo.

domingo, 3 de julho de 2011

Frases de São José Maria Escrivã de Balaguer

Frases de São José Maria Escrivã de Balaguer

(Barbastro, Aragão, 9 de Janeiro de 1902— Roma, 26 de Junho de 1975) 





sábado, 2 de julho de 2011

A Filosofia para a Sala-de-Aula

G.K. Chesterton
Publicado originalmente no Daily News, 22 de junho de 1907
Tradução de Gabriele Greggersen
Retirado do site: CHESTERTONBRASI.ORG



O que o homem moderno precisa compreender é simplesmente que toda a argumentação começa com uma afirmação ponto-de-partida; isto é, com algo de que não se duvida. Pode-se, é claro, duvidar da afirmação base, mas, nesse caso, já estaria dando início a outra argumentação diferente, propondo que se parta de outra suposição. Todo argumento inicia por um dogma infalível, e esse dogma absoluto, por sua vez, só pode ser discutido, se recorrermos a outro dogma infalível: nunca se pode provar o primeiro ponto-de-partida (senão não seria ponto-de-partida).

Este é o be-a-bá do raciocínio lógico. E tem esta vantagem especial de que pode ser ensinado na escola, como qualquer outro be-a-bá. Não dar início a qualquer discussão sem antes declarar abertamente os postulados de cada um, é uma regra a ser ensinada tanto na filosofia, quanto na matemática de Euclides, ou em qualquer aula comum, usando giz e lousa. E penso que esse princípio poderia ser ensinado de forma simples e racional até mesmo ao jovem, antes de aventurar-se pelo mundo, à mercê da "lógica" e da filosofia imposta pela mídia.

Muitas das desorientações e dúvidas no campo religioso, surgem pelo fato de os céticos de hoje começarem sempre, falando sobre tudo aquilo em que eles não acreditam. Mas, mesmo de um cético, o que queremos saber primeiro é em que ele realmente acredita. Antes de começar a discutir, é preciso saber o que é que não se discute. Essa confusão aumenta infinitamente pelo fato de que todos os céticos de nosso tempo são céticos em diferentes graus dessa dissolução que é o ceticismo.

Agora, nós temos (espero), uma vantagem sobre todos esses novos filósofos sabidos: mantemo-nos em sã consciência. Acreditamos que existe, de fato, a catedral de São Paulo; e grande parte de nós acredita em São Paulo. É preciso deixar bem claro que acreditamos em muitas coisas que, embora façam parte de nossa existência, não podem ser demonstradas. Nem é preciso meter religião na história. Diria até que todos os homens de bom senso, acreditam firme e invariavelmente em umas quantas coisas que não foram provadas e que nem sequer podem ser provadas.

De forma resumida, são elas:

(1) todo ser humano em sã consciência acredita que o mundo e as pessoas ao redor dele são reais e não um produto da sua imaginação ou de um sonho. Ninguém começa a incendiar Londres, se está convencido de que seu criado logo o acordará para o café da manhã. Mas não temos provas, em nenhum momento, de que tudo não passa de um sonho. Que algo exista além de mim é uma afirmação que não está comprovada (nem se pode comprovar...).

(2) Todo homem em sã consciência, acredita não somente que este mundo existe, mas também que ele tem importância. Todo homem acredita que há, em nós, um tipo de obrigação de nos interessarmos por esta visão da vida. Não concordaria com alguém que dissesse, "Eu não escolhi esta farsa e ela me aborrece. Fiquei sabendo que uma senhora idosa está sendo assassinada no andar de baixo, mas eu vou é dormir ". O fato de que há um dever de melhorar coisas não feitas por nós é algo que não foi provado e não se pode provar.

(3) Todos os homens em sã consciência acreditam que existe uma certa coisa chamada eu, self ou ego e que é contínua. Não há nenhum centímetro de meu cérebro igual ao que era há dez anos atrás. Mas se eu salvei a vida de um homem numa batalha há dez anos atrás, fico orgulhoso; se me acovardei, sinto-me envergonhado. A existência desse "eu" axial nunca foi comprovada e não pode ser comprovada. Trata-se de uma questão mais do que "improvável" e que é muito debatida entre os metafísicos.

(4) Finalmente, a maioria dos homens em sã consciência acredita, e todos o admitem na prática, que têm um poder de escolha e responsabilidade por suas ações.

Seguramente é possível elaborar algumas afirmações simples como as acima, para que as pessoas possam saber a que se ater. E se os jovens do futuro não vão ter formação em religião, pode-se-lhes ensinar, pelo menos, de forma clara e firme, um pouco de bom senso, três ou quatro certezas do pensamento humano livre.

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1. "- Lógica, disse o professor para si mesmo. – Por que não ensinam mais lógica nas escolas" (C.S. Lewis, O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa. São Paulo: Martins Fontes, 1997,p. 50) e, no final da história, o professor comenta novamente, agora em alto e bom tom:
" - Céus! O que é que estão ensinando às crianças na escola?" (Idem, p. 180).